CSDDD – Divisor de águas para a contabilidade empresarial

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A CSDDD (ou CS3D, como também é conhecida) da União Europeia, atualmente em processo legislativo, tem o potencial de ser um grande divisor de águas para a contabilidade empresarial. Em tradução libre, a sigla significa “Diretiva de Devida Diligência em Sustentabilidade Corporativa”. Embora seu impacto total ainda não esteja claro, já que ainda não foi implementada (a previsão é de que esteja operativa em 2026/27), veremos aqui seus potenciais desdobramentos e porque está gerando um certo rebuliço no mundo da contabilidade.

Mas, como no mundo das finanças e da sustentabilidade as siglas emergem furiosamente, antes de falar sobre a CS3D, vamos esclarecer alguns pontos e diferenciá-la de outras iniciativas-chave no quadro de finanças sustentáveis da União Europeia:

SFRD (Sustainable Finance Disclosure Regulation): Este regulamento se concentra em como as instituições financeiras divulgam os riscos e impactos de sustentabilidade de seus investimentos. É uma regulamentação da União Europeia que torna obrigatória a divulgação de informações ESG (Ambientais, Sociais e de Governança) para gestores de ativos e outros participantes do mercado financeiro, com disposições substanciais do regulamento em vigor desde 10 de março de 2021.Pense neste regulamento como transparência para produtos financeiros.

CRSD (Corporate Sustainability Reporting Directive): esta regulamentação já em vigor exige que grandes empresas relatem seu desempenho ambiental e social, fornecendo insights mais profundos sobre suas operações.

Taxonomia da UE: Este sistema de classificação define quais atividades econômicas são consideradas ambientalmente sustentáveis, atuando como um guia para empresas e investidores.

CS3D (CSDDD, ainda em desenvolvimento): Esta iniciativa visa estabelecer um padrão global para a due diligence (devida diligência) de sustentabilidade corporativa, promovendo a harmonização e as melhores práticas além da UE.

Embora distintas, essas regulamentações e iniciativas estão interconectadas. A Taxonomia da UE informa quais atividades as empresas relatam sob a CRSD, e ambas alimentam os requisitos de due diligence da CSDDD. Pense nelas como blocos de construção para um futuro sustentável para as finanças e negócios europeus.

Agora que esclarecemos os players, vamos mergulhar no potencial impacto revolucionário da CSDDD na contabilidade corporativa e porque ela tem a possibilidade de remodelar o cenário financeiro.

O que é a CSDDD?

Em essência, a CSDDD visa tornar as empresas responsáveis pelos impactos ambientais e de direitos humanos em toda a sua cadeia de valor, não apenas dentro de suas próprias operações. Isso significa que as empresas precisarão identificar, avaliar e abordar possíveis danos em suas cadeias de suprimento, desde a obtenção de matéria-prima até o descarte do produto.

Embora ainda não seja aplicável, a CSDDD já provocou discussões e movimentações significativas:

Maior Conscientização: As empresas estão se preparando ativamente para a implementação da diretiva, com muitas delas realizando análises de gap e avaliando sua prontidão para a conformidade.

Mudança de Foco: A sustentabilidade está ganhando destaque nas discussões do conselho e nas estratégias corporativas, com potenciais implicações financeiras que exigem atenção.

Padrões Emergentes: Muitas organizações estão desenvolvendo padrões e frameworks para orientar as empresas na implementação de processos eficazes de due diligence.

Potencial Impacto na Contabilidade Corporativa:

A CSDDD tem o potencial de mudar fundamentalmente a forma como as empresas contabilizam suas atividades, com diversas áreas-chave de impacto:

Ativos Intangíveis: As empresas deverão identificar e valorizar ativos intangíveis relacionados à sustentabilidade, como sua licença social para operar ou a reputação da marca.

Passivos Contingentes: Possíveis riscos ambientais e de direitos humanos serão reconhecidos como passivos financeiros, impactando balanços e índices financeiros.

Relatórios Não Financeiros: A CSDDD levará a relatórios mais abrangentes e padronizados sobre métricas de sustentabilidade, juntamente com as demonstrações financeiras tradicionais. As empresas estão bem acostumadas a relatar dados financeiros, e agora terão de fazer o mesmo com dados socioambientais, muitos dos quais já existem no sistema das empresas.

Papel do Auditor: Os auditores precisarão expandir seu escopo para avaliar a eficácia dos processos de due diligence das empresas e a confiabilidade das divulgações de sustentabilidade.

Desafios e Oportunidades:

A implementação da CSDDD apresenta vários desafios para as empresas, que se interpõem no caminho da regulamentação, mas também, oportunidades.

Complexidade e Cadeias de Suprimentos Globais: Mapear e entender os riscos em cadeias de suprimentos globais complexas é difícil. As empresas podem não ter dados prontamente disponíveis ou enfrentar dificuldades para acessar informações devido a barreiras linguísticas ou instabilidade política.

Custos de Implementação: Integrar processos eficazes de due diligence exige investimento em recursos, treinamento e tecnologia. Pequenas e medias empresas provavelmente terão dificuldades em arcar com esses custos.

Incerteza Jurídica: As negociações ainda estão em andamento, e o formato final da diretiva ainda não está claro, gerando incerteza para as empresas que tentam se preparar para a conformidade.

Papéis Públicos vs Privados: Alguns argumentam que lidar com questões sociais como as mudanças climáticas e os direitos humanos é responsabilidade principal dos governos, não das empresas. A CSDDD pode turvar essa linha, levantando preocupações sobre o alcance excessivo das empresas.

Aplicação e Eficácia: Garantir a aplicação consistente em todos os estados membros da UE e responsabilizar as empresas por violações representa um desafio significativo. Medir o impacto real da diretiva na sustentabilidade também requer sistemas de monitoramento robustos.

Competição e Condições de Igualdade: É crucial garantir condições de igualdade para todas as empresas, independentemente do tamanho ou localização. Há preocupações de que empresas menores podem ter dificuldades para competir com empresas maiores equipadas com melhores recursos para a conformidade.

Foco em Relatórios vs Ação: Os críticos argumentam que focar apenas nos riscos de relatórios pode ofuscar a tomada de medidas concretas para abordar as preocupações de sustentabilidade e direitos humanos. O progresso real exige uma mudança significativa no comportamento corporativo, não apenas no papel.

Cooperação Internacional: Embora a UE seja líder, uma cooperação internacional mais ampla sobre os padrões de due diligence e sua aplicação é crucial para maximizar o impacto. Alinhar diferentes abordagens nacionais ainda é um desafio.

Esses são apenas alguns dos principais desafios que a CSDDD enfrenta. Apesar desses obstáculos, a iniciativa representa um passo significativo em responsabilizar as empresas por seus impactos sociais e ambientais. Abordar esses desafios de forma eficaz será crucial para o seu sucesso em impulsionar mudanças positivas em direção a um panorama de negócios mais sustentável e responsável.

No entanto, também apresenta oportunidades para:

Gestão de Riscos Aprimorada: A identificação e mitigação proativa dos riscos de sustentabilidade pode levar a economias de longo prazo e aumento da competitividade.

Confiança do Investidor: Um bom desempenho em sustentabilidade pode atrair investidores cada vez mais focados em fatores ESG (ambiental, social e de governança).

Inovação: A CSDDD poderia impulsionar a inovação em tecnologias sustentáveis e modelos de negócios.

Conclusão:

O impacto da CSDDD na contabilidade corporativa ainda está se desenrolando, mas seu potencial para reformular o campo é inegável. À medida que as empresas se preparam para sua implementação, devem abraçar o desafio e reconhecer as oportunidades que ela apresenta para construir negócios mais sustentáveis e resilientes. Integrar um mindset inovador que permita repensar processos e modelos de negócios insustentáveis, fazendo uso de novas tecnologias, será a maior alavanca para competitividade das empresas, e somente possível com a visão integrada destas questões juntamente com a cadeia produtiva e diversos stakeholders.

É importante observar que os detalhes da CSDDD ainda estão sendo negociados, e seu impacto final pode diferir das expectativas atuais. No entanto, uma coisa é certa: a diretiva representa um passo significativo em direção a uma maior responsabilidade corporativa pela sustentabilidade, e suas implicações para a contabilidade corporativa serão abrangentes.

 

Fonte: O Especialista

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Monica Kruglianskas

Quem escreveu?

Monica Kruglianskas
Coordenadora Pedagógico da Área de Sustentabilidade Atua como sênior advisor em sustentabilidade e reputação corporativa há mais de 20 anos na Europa e América Latina. Atualmente é coordenadora e professora de sustentabilidade na FIA Business School. Antes, Monica foi Head of Sustainability na Danone Espanha e consultora em think tanks como Cambridge Institute for Sustainability Leadership e Forum for the Future, em Londres.

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