O aspecto social da agenda ESG: o papel da empresa

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Sem dúvida, o tema do ESG – sigla para a expressão inglesa, Ambiental, Social e Governança – é algo que veio para ficar e ocupar a atenção das empresas. Não que em si tal conceito traga muita novidade. Afinal, estas dimensões já vêm sendo objeto de atenção das organizações há um bom tempo. Talvez, a maior novidade esteja na origem da atual relevância: os grandes investidores, em particular os fundos globais, que têm intensificado a cobrança para que as empresas fortaleçam sua ação nestes três campos, com uma agenda ESG.

Assim, com esta notoriedade, muito tem sido escrito sobre o assunto e muitos exemplos de iniciativas empresariais são apresentados como resposta a esta “nova” demanda. Contudo, chama a atenção a desigualdade nas iniciativas: enquanto as práticas ligadas à governança, há mais tempo no radar das organizações, e as ações voltadas à preservação do meio ambiente, que buscam responder aos desafios para a conservação do planeta, têm merecido uma atenção especial, a dimensão social ainda recebe um tratamento um tanto tímido.

 

Afinal, qual o tamanho do “S” na Agenda ESG?

Em primeiro lugar, é preciso lembrar que o campo social para as empresas tem duas dimensões: uma interna e outra externa. 

Quando lemos sobre as práticas que vêm sendo adotadas pelas empresas fica muito claro que a atenção que vem sendo dada se concentra mais na dimensão interna. Por exemplo, com ações e políticas voltadas para saúde e segurança do funcionário, diversidade e inclusão. Contudo, é preciso reconhecer que estas práticas não vão muito além do que convencionalmente conhecemos como a clássica “gestão dos recursos humanos”.

Mas, a questão mais aguda se dá quando olhamos para o lado externo. Aqui, o que se vê na maioria das reflexões teóricas e nas ações práticas são iniciativas voltadas à privacidade do cliente, segurança de dados, segurança do produto, etc. É claro que estas são questões relevantes! Mas, será que não está faltando algo mais efetivo no campo das relações com a comunidade?

De fato, não é de hoje que se discute a responsabilidade que as empresas têm de eliminar ou mitigar os efeitos das externalidades que suas atividades provocam junto às comunidades onde atuam. Aliás, essa necessidade tem levado empresas a desenvolver estratégias e programas de responsabilidade social, que têm sido relevantes. Não só para melhorar as condições das comunidades do entorno, mas também para fortalecer o relacionamento da empresa com estas mesmas comunidades.

 

valor compartilhado na agenda esg

 

O potencial do Valor Compartilhado

Assim, companhias com uma visão mais ampliada têm aproveitado propostas como aquelas feitas por Michael Porter sobre Valor Compartilhado. Isto é, para levarem seus programas sociais para dentro das estratégias de negócios, obtendo resultados econômicos, ao mesmo tempo em que ajudam a desenvolver as comunidades do entorno.

Em síntese, há um potencial enorme de ação para fortalecer o “S” do ESG. No entanto, naturalmente, é preciso ser criativo e ousado para fortalecer tais iniciativas. Mas, criatividade e ousadia não são marcas do legítimo empreendedorismo?

 

Então, o que pode ser feito para tornar mais forte o pilar social do ESG?

 

A iniciativa pela empresa

Em janeiro de 2011, a revista Harvard Business Review publicou um artigo dos professores Michael Porter e Mark Kramer, com um título bem pouco modesto: “Como consertar o capitalismo e inaugurar uma nova era de crescimento”. Aqui o objetivo era ampliar o conhecimento sobre o tema do “Valor Compartilhado”, que havia sido abordado em outro artigo dos mesmos autores, publicado em 2006.

Sem dúvida, o artigo de 2011 pode até já ser considerado um clássico, pois já chamava a atenção para outros aspectos importantes. Antes mesmo de falar sobre Valor Compartilhado, o tema principal, os autores faziam uma apreciação crítica sobre como a atuação das empresas é vista de uma forma geral. Assim, o primeiro parágrafo do artigo aponta: “O sistema capitalista está sitiado. Nos últimos anos, a atividade empresarial foi cada vez mais vista como uma das principais causas dos problemas sociais, ambientais e econômicos. É generalizada a percepção de que a empresa prospera à custa da comunidade que a cerca”.

Os riscos de uma empresa desconectada da comunidade

Em seguida, Porter e Kramer prosseguem argumentando que tal situação é altamente prejudicial. Porque, além de gerar desconfiança na sociedade quanto à atividade empresarial, leva, muitas vezes, o poder público a criar leis e regulamentos que contribuem para inibir o crescimento econômico.

Diante disso, os autores alertam que é preciso reverter esta situação e que cabe às empresas tomar a iniciativa para que isto ocorra. Então, se isto já se mostrava evidente há dez anos atrás, imagine-se hoje, quando as pressões só aumentaram. Assim, Porter e Kramer são claros quanto ao que a empresa deve fazer: “A empresa deve liderar a campanha para voltar a unir a atividade empresarial e a sociedade. Líderes empresariais e intelectuais sofisticados já sabem disso; começam a surgir elementos promissores de um novo modelo. Ainda não temos, no entanto, um marco geral para nortear essa iniciativa – e a maioria das empresas continua presa a uma mentalidade de “responsabilidade social” na qual questões sociais estão na periferia, não no centro”.

 

dimensão social sigla esg

 

Avanços ainda tímidos na dimensão social externa

No entanto, é justo ponderarmos que, de lá para o presente, houve progressos. Inclusive, o próprio movimento ESG tem sido um poderoso instrumento estimulador para que a responsabilidade social se amplie e se fortaleça junto às empresas. Contudo, como argumentamos na primeira parte deste artigo, as ações sociais na Agenda ESG ainda podem ser vistas como muito tímidas. Sobretudo quando o que está em jogo é a atuação na dimensão externa do ESG.

Sobretudo, concordamos com Porter e Kramer: a iniciativa deve partir da empresa. Em outras palavras, é ela que deve partir para abordar a comunidade do entorno e trabalhar com ela em uma estratégia de responsabilidade social que possa trazer ganhos e benefícios para todos os envolvidos.

Não é nosso objetivo, nos limites deste artigo, fazer uma avaliação minuciosa do que deve e pode ser feito. Mas, gostaríamos de destacar alguns elementos que devem ser considerados quanto à abordagem que uma empresa venha a adotar para trabalhar junto a uma comunidade.

 

Empresa e Comunidade no aspecto social da Agenda ESG: alguns cuidados para uma abordagem exitosa

Como dissemos, entendemos que a iniciativa de aproximação com a comunidade deve partir da empresa. Para que esta aproximação seja exitosa, alguns aspectos devem ser considerados:

 

1. Primeiro, toda comunidade conta com uma estrutura, ainda que não-formal, de lideranças

Assim, são elas que recebem a autorização de todos para falar em nome da comunidade, junto a instâncias públicas e privadas. Por isso, é essencial que a empresa conheça estas lideranças e prepare seus representantes para dialogarem e negociarem com elas.

 

2. Também toda comunidade já tem um histórico de relacionamento com o poder público, responsável por conceber, implementar e sustentar as políticas públicas

Então, é importante que a empresa conheça o grau de organização e de relacionamento que a comunidade mantém junto ao poder público. Afinal, o ideal é que haja sintonia entre as ações dos três setores: governo, empresas e sociedade. Quanto mais forte for esta integração, maior será o impacto positivo das ações realizadas.

 

3. Além disso, a comunicação com a comunidade deve ser pensada de forma cuidadosa

Sobretudo, a empresa precisa mostrar, de forma clara, a sua intenção de trabalhar em conjunto e com a maior transparência. Para que isso ocorra, é preciso que o discurso sobre atuar em parceria se mostre verdadeiro. Aqui, nunca é demais lembrar que a verdadeira parceria pressupõe uma relação entre iguais, sem linhas de comando e subordinações.

 

4. É preciso compreender que comunidade significa diversidade, algo que não combina com posições homogêneas.

Com certeza, trabalhar com a diversidade é algo muito rico, mas que oferece muitos desafios. Por isso, os representantes da empresa precisam estar bem capacitados para fortalecerem estas relações.

responsabilidade social na agenda esg

 

5. Aliás, parte deste preparo é reconhecer o ritmo de atuação de uma comunidade

Aliás, esse ritmo não é aquele ao qual os gestores estão acostumados em seu trabalho nas empresas. Então, muitas vezes será necessário se prepar para atuar em um ritmo de tempo mais lento, o que exige paciência e senso de oportunidade.

 

6. Um erro comum é cair na tentação de que a empresa já sabe do que a comunidade precisa

Assim, com este pensamento em mente, a empresa procura enquadrar estas necessidades nos limites dos programas que já dispõe. No entanto, preciso lembrar do ditado que diz que “cada um sabe bem onde dói o seu calo”. Ou seja, o ideal é que a empresa procure fazer um diagnóstico da situação da comunidade. Não só para conhecer melhor suas necessidades, mas também para identificar o que, dentre elas, é mais crítico, mais prioritário para o momento atual que ela vive.

 

O valor do Capital Social

Sempre que se atua para mudar ou melhorar uma situação, existem duas formas de olhar para ela:

 

  • A partir do que falta, das carências. Assim, com este olhar, damos ênfase às deficiências, aos problemas que afetam uma organização ou uma comunidade.

 

  • A partir do que já existe. Ou seja, do que as próprias pessoas, grupos e organizações têm de capacidade para realizar, valorizando assim os ativos da própria comunidade.

 

Neste sentido, vale lembrar que toda comunidade é formada por pessoas e grupos com diversificada gama de competências. Isto é, conhecimento, habilidades, experiência e formas de se relacionar que formam um valioso patrimônioAssim, em um sentido mais amplo, este conjunto de experiências compõe o que é conhecido como capital social.

 

capital social

 

O que é o capital social?

A saber, o capital social forma-se a partir de toda experiência que uma comunidade vem acumulando ao enfrentar e buscar atender suas necessidades. Assim, é uma forma de capital intangível que envolve:

  • Relações de confiança e colaboração existente entre as pessoas e organizações;
  • Competência desenvolvida em lidar com conflitos;
  • Capacidade de associação e cooperação;
  • Existência de redes informais de solidariedade e ajuda mútua;
  • Comunicação baseada na partilha de experiências.

Por isso, conhecer o Capital social de uma comunidade pode ser um elemento importante para uma empresa, quando ela está construindo e implementando sua estratégia de responsabilidade social. Afinal, trata-se de um ativo que pode ser utilizado nesta estratégia. Aliás, pode não apenas tornar as intervenções da Agenda ESG mais efetivas, como também ajudar a usar melhor o tempo, esforços e recursos.

Portanto, é algo a ser pesquisado pela empresa em seu trabalho de aproximação com a comunidade.

 

Um olhar mais amplo sobre a questão social na Agenda ESG

Com certeza, há muito o que uma empresa pode fazer para tornar mais efetiva a sua atuação social mais responsável. Ou seja, há muito mais que pode ser feito para fortalecer e ampliar a dimensão social, o “S” do ESG.

Então, neste artigo, procuramos não só chamar atenção para esta possibilidade, mas também mostrar que o êxito no trabalho nesta dimensão social da agenda ESG depende muito da empresa. Isto é, de como a companhia decide adotar uma atitude de maior protagonismo, como também a forma que escolhe para se aproximar da comunidade.

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Quem escreveu?

Alfredo dos Santos Junior
Professor de Ética, Responsabilidade Social Empresarial e Gestão para Organizações da Sociedade Civil.

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